quinta-feira, 3 de agosto de 2017

TDAH não é desculpa para um desempenho escolar ruim

Mais que a medicação, a postura e organização são fatores decisivos no tratamento do TDAH.

“Meu filho tira notas baixas por que tem TDAH. Vamos agendar algumas aulas particulares para ajudá-lo?” Eu ouço essa frase diariamente. A questão é muito séria e os pais precisam aprofundar os debates sobre o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), popularmente chamado de DDA. É preciso entender que a frase acima pode ter efeitos colaterais para o futuro do seu filho.
A premissa é perigosa: alguns pais consideram que uma criança (ou adolescente) com laudo de TDAH automaticamente terá mal desempenho escolar. Esta presunção é equivocada, é mais uma forma de tirar a responsabilidade das costas do sujeito ativo do processo de aprendizagem (o estudante). Nenhum pai diz, mas muitos pensam: “Meu filho não tem culpa pelas notas baixas, afinal, ele tem um transtorno de atenção”. Não é bem assim.
A autora inglesa Pamela Druckerman explicou em seu livro “Bringing Up Bébé” (publicado no Brasil sob o título “Crianças Francesas Não Fazem Manha”) os motivos pelos quais os alunos matriculados em Paris apresentam índices de TDAH muito abaixo do que crianças que vão ao colégio em Washington D.C.
Druckerman vai no ponto, ela mostra que os médicos franceses buscam avaliar o problema subjacente que está causando o sofrimento da criança e não apenas o cérebro dela. Avaliam o contexto social daquela criança/adolescente. Os psiquiatras, então, optam por tratar a questão com psicoterapia ou aconselhamento familiar.
Entender o conceito do transtorno de aprendizagem é fundamental para compreendermos suas implicações no dia a dia do aluno, no que podemos exigir dele e, sobretudo, no que podemos esperar dele.
Um alerta: não é porque uma criança é agitada ou não presta atenção nas coisas que ela tem TDAH. É preciso que se faça um diagnóstico profissional, multidisciplinar. Os pais precisam seguir um caminho longo para ter um diagnóstico seguro."
O que é, afinal, o TDAH? Costumo usar o seguinte conceito: é uma síndrome (conjunto de sintomas) caracterizada por distração, agitação/hiperatividade, impulsividade, esquecimento, desorganização, adiamento crônico (entre outras características) em intensidade alta, que, consequentemente, comprometem o rendimento escolar e/ou social de uma criança/adolescente.
Em entrevista à jornalista Marília Gabriela, o neuropediatra Paulo Mattos, autor do livro “No Mundo da Lua”, resumiu a questão: “São crianças que apresentam um exagero na inquietude, na desatenção e na impulsividade”. Notem: ele usa a palavra “exagero”.
Aprofundemos, o TDAH apresenta uma disfunção em áreas do córtex cerebral, conhecido como lobo pré-frontal. Quando seu funcionamento está comprometido, ocorrem dificuldades com concentração, memória, hiperatividade e impulsividade, originando os principais sintomas do transtorno.
Normalmente, em atividades como estudo, leitura ou outras que exijam concentração, o cérebro aumenta os níveis de ativação, justamente para dar conta destas atividades. Nos casos típicos de TDAH, a característica psicofisiológica mais comum é a hipofunção/hipoativação do córtex pré-frontal. Trocando em miúdos, uma quantidade significativa de neurônios pulsa mais devagar do que o esperado, especialmente quando as circunstâncias exigem maior esforço mental e, portanto, maior ativação.
Em paralelo à questão neurológica, o TDAH tem fortes componentes comportamentais. Nossa maneira de ser – tanto o funcionamento do cérebro quanto a personalidade, hábitos e preferências – é resultado de uma interação entre nossa carga genética e todas as experiências pelas quais passamos.
O cérebro se desenvolve a partir destas interações, de toda a estimulação que recebe e das aprendizagens que dela decorrem. Podemos dizer, sem sombra de dúvida, que o cérebro se constrói e se reconstrói ao longo da vida. A isto a ciência dá o nome de neuroplasticidade. Por isso, depende dos nossos estímulos agravarmos ou controlarmos os sintomas do TDAH.
É fundamental que os pais entendam o diagnóstico do transtorno como uma característica a mais do filho, que a criança/adolescente terá de se esforçar mais, mas que não tratem o mau desempenho do estudante como algo inerente e automático."
A neuropsicóloga Suzana Myrian Gonçalves explica que muito da melhoria do desempenho escolar das crianças depende da adaptação da família. “Os pais precisam mudar a rotina quando têm uma criança com laudo de TDAH. Se a família for disfuncional, as dificuldades do filho se agravam. Por outro lado, se os pais são atenciosos, têm tempo de estudar com a criança, conseguem sentar e comer com ela, a melhoria do desempenho aparece. Às vezes, os sintomas até são dissolvidos por esta rotina funcional”, ensina.
Estes pais cobram dos seus filhos, oferecem a eles uma rotina em casa que favoreça os estudos, estabelecem combinados e têm a consciência de que eles podem obter um excelente desempenho escolar. Vão suar mais? Vão. Mas é impossível? Longe disso!
Aprofundar os estudos sobre o TDAH é fundamental não apenas para o desempenho escolar do seu filho hoje. É fundamental para o desempenho social e profissional do seu filho por toda a vida.